Em decisão liminar, o TJDFT mandou o GDF suspender a comercialização e construção de lotes inicialmente destinados para serviços públicos
Em decisão liminar, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) suspendeu a venda e a construção de empreendimentos privados em 85 lotes de Águas Claras. Originalmente os terrenos estavam destinados para equipamentos públicos, como escolas e postos de saúde, por exemplo.
Entre os lotes, 31 estão com empreendimentos consolidados. Outros 20 estão em construção ou com terrenos vendidos ainda livres, e 34 estão sob responsabilidade do Governo do Distrito Federal (GDF). Segundo a decisão, esses 54 remanescentes devem ser preservados e destinados para equipamentos públicos.
Entre os 20 terrenos em construção ou ainda livres, três estão em obras (Quadra 104, lote 2, Quadra 107, lote AI-1 e Quadra 202, lote 2), outros dois têm galpões em construção (Rua 35 Norte, lote 2 e Rua 35 Sul, lote 6) e um possui um empreendimento inacabado e abandonado (Av. Parque Águas Claras, lote 75). A ação cobra a demolição e a desocupação dos lotes.
Quanto aos demais 31 lotes vendidos com as obras concluídas, o processo não cobrou remoções, apenas ressarcimento financeiro, a título de danos morais e ambientais.
O GDF e a Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (Terracap) arrecadaram R$ 990.269.827 por meio da venda destes terrenos. A ação cobra 40% do valor, a título de danos morais e ambientais, justamente para a construção de equipamentos públicos para a região. Ou seja, um investimento na ordem de R$ 396.107.930,80.
A Justiça ainda vetou temporariamente a emissão de alvará de construção ou Habite-se para novos empreendimentos. O TJDFT também proibiu a venda, cessão, penhora, doação ou qualquer outro tipo de registro vinculado à matrícula dos lotes, atualmente em áreas pertencentes à Terracap.
O processo
Em dezembro último, a Associação dos Moradores e Amigos de Águas Claras (Amaac) entrou com a ação civil pública no TJDFT que questionou a legalidade da requalificação e desafetação dos terrenos, conduzidas pela Terracap e pelo GDF.
Na última quarta-feira (17/1), o juiz da Vara do Meio Ambiente, Carlos Frederico Majora de Medeiros, decidiu interromper comercialização dos lotes ou obras nas áreas.
Para o presidente da Amaac, Román Cuattrin, a liminar – uma decisão provisória – representa uma vitória para a população de Águas Claras.
A Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílio (Pdad) de 2021 constatou que aproximadamente 20 mil moradores não têm plano de saúde na região e 7 mil estudam na rede pública. Contudo, a cidade não conta com unidade de saúde nem escolas públicas.
“O próprio GDF é ciente da necessidade dos equipamentos públicos, mas fecha os olhos e acaba vendendo lotes onde, depois, teríamos a chance de contar com o serviço”, criticou Román. “A cada mês, mais um lote vai para licitação e é perdido.”
“Paliteiro de espigões”
Na decisão, o juiz Carlos Frederico Maroja mencionou os prejuízos decorrentes do crescimento desordenado e da especulação imobiliária em Águas Claras.
“[Resulta em] uma situação que, obviamente, afeta negativamente a qualidade de vida dos moradores daquela região: um paliteiro de espigões com dezenas de pavimentos, em uma cidade inchada, com problemas graves de mobilidade (é comum a afirmação de que os engarrafamentos em Águas Claras começam desde as garagens dos edifícios) e com escassa oferta de serviços públicos de saúde, segurança e educação”, destacou o magistrado.
Para o juiz, “o enorme incremento da população de Águas Claras exigiria, como pondera corretamente a associação autora, não a redução, mas o aumento do número de equipamentos públicos comunitários”.
A disputa pelos terrenos é antiga. Em protesto realizado em junho de 2021, os moradores pintaram na parede de um dos terrenos a seguinte frase: “Aqui jaz uma escola”.
Anteriormente, a população entrou com ação para questionar a constitucionalidade da mudança de finalidade para uso dos lotes. As obras foram suspensas, mas a Justiça questionou a validade da ação; então, as obras e vendas continuaram.
Posicionamentos
Sobre o tema, a Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF), que representa o GDF no processo, informou ainda não ter sido intimada da decisão.
Por meio de nota, a Terracap comunicou que o projeto urbanístico de Águas Claras foi aprovado e licenciado na década de 1990. “Como determina a legislação, foram criados lotes destinados a equipamentos públicos, imediatamente registrados em nome do Distrito Federal”, detalhou a empresa pública.
“Todos os demais imóveis destinados a uso comercial, residencial e institucional foram registrados em nome da Terracap e, ao longo dos anos, disponibilizados para venda por meio de editais de licitação. A presente ação judicial refere-se a tema já tratado no âmbito do TJDFT”, pontuou a Terracap.
Além disso, a agência informou que os lotes comercializados pela Terracap têm os usos definidos no projeto original e na legislação vigente à época de cada venda. “A empresa recorrerá da decisão proferida pela Vara de Meio Ambiente Desenvolvimento Urbano e Fundiário”, concluiu.
fonte: Francisco Dutra metropoles.com